terça-feira, 24 de junho de 2014

Noite achada



Uma bacia de plástico foi a grande convidada da noite de 23 de junho, véspera de São João. E eu, estava crente que depois do jogo o amendoim japonês seria a coisa mais próxima das guloseimas juninas que eu provaria. Enganei-me feio. Thiago e Denyse nos convidaram para uma festa de São João no bairro Novo Horizonte.
Eu fiquei internamente feliz, acho que externei essa alegria na roupa xadrez que vesti para a ocasião. Alegria justificada, já que há tempo não sinto o calor da fogueira arder meus olhos  enquanto as bandeirolas dançam soltas o forró pé de serra, nem aquele cheiro de pólvora que as bombas estouradas pelos meninos traquinas deixam no ar.

Chegamos a tempo de erguer o barbante, puxando uma ponta dos pés de manga até o retrovisor do caminhão estacionado no pátio da casa de dona Magnólia. Eram bandeirolas de papel que cortamos de revistas e por isso tinham muitas formas e rostos diferentes, mas no final, quando já estavam todas penduradas e sendo guiadas pelo vento, era como se os rostos estampados estivessem felizes por estar na festa junto com a gente. 

No chão de terra, igualzinho ao daqueles no nordeste, a fogueira havia sido montada, alta e de troncos largos, tinha tudo para queimar a noite inteira. E queimou. A brasa estalava e ardia no vermelho da chama, a fumaça aguava-me os olhos que teimavam em querer ficar olhando para as pequenas faiscais subindo para o céu até se confundirem com estrelas.

A alegria de estar em família é sempre igual, e a família de Thiago é muito animada. Lucas, o pequeno  foi a estrela da noite, sem sanfona nem botinas ele me fez dar boas gaitadas de riso à noite toda. Com apenas cinco anos sabe bem que quer: “um tabet com utubi, jogos, facebook e zapzap”. Ah, e uma bicicleta. Ufa, menos mal. E não é papai Noel quem vai lhe dar, ele irá comprar  nas casas Bahia com seu próprio dinheiro arrecadado no cofrinho. Ele me disse que já tem 38 moedas, falta pouco Lucas.

E assim seguimos a noite, sentados em circulo jogando conversa fora e ouvindo estórias de quem tem mais experiências. Gosto de ouvir essas estórias, particularmente as de outras gerações e outros tempos. Enquanto isso, comíamos canjica, amendoim, cachorro quente e bolo de aipim (Mané pelado) como me foi apresentado. 

Lá pelas tantas, a matriarca segura à bacia de plástico e dá algumas voltas na fogueira fazendo uma reza, depois que ela parar, quem olhar para a bacia e se ver, chega até o próximo São João. Quem não tiver sorte, pode não dançar o próximo forró.  Fiquei com medo de olhar e não me ver, mas acabei olhando e lá estava eu, no fundo da bacia sorrindo aliviada pra mim mesma. Ufa! 

E não parou por aí, a noite esteve recheada de superstições. Em outra, a moça põe duas brasas da fogueira na bacia, que representam ela e o amado. Se as brasas ficarem juntas é porque vai ter casamento, se não, é separação na certa.

Por essas simpatias, pensei que estava na festa do santo errado, santo Antônio que é o santo casamenteiro. São João é o “festeiro”, mas dona Magnólia nem se importou, e ensinou mais uma: um fio de cabelo é amarrado em uma aliança, a pessoa vai pra perto da fogueira com um copo com agua até a metade, mergulha a aliança e  quantas vezes ela bater no copo significa quantos anos demora para a pessoa se casar. Fiz o “teste” e o meu não bateu nenhuma vez, ela disse que quando é assim, casa no mesmo ano.

Sem dúvida essa foi uma noite achada. Um serendipete no meio do calendário, uma noite fria e estrelada de junho que me levou para mais perto de casa, com direito à eterna discursão da canjica X mungunzá.
Mas o que importa mesmo é que é festa, e Viva São João!!  Os meninos  já estão soltando bombas para assustar o cachorro que corre atordoado para debaixo da mesa e a mulherada desavisada que conversa na cozinha.